sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Escritor Luiz Ruffato concede entrevista ao blog Over Shock

Confira abaixo a entrevista realizada pelo blog Over Shock, em parceria com o blog da Casa do Escritor Pinhalense “Edgard Cavalheiro”, com o escritor Luiz Ruffato, durante a I Semana Edgard Cavalheiro:

Ricardo Biazotto (Over Shock)Já há algum tempo eu sigo sua página no Facebook e a primeira coisa que despertou o meu interesse foi quando você postou sobre a Igreja do Livro Transformador. Eu pesquisei sobre o assunto e achei uma coisa bem interessante, então eu gostaria que você comentasse sobre a ideia desse projeto e o por que dele.
Luiz Ruffato – Bom, essa ideia nasceu na verdade é uma brincadeira, nasceu de uma brincadeira, mas é uma coisa digamos assim, séria, porque eu sempre quando ia nas palestras e tudo eu contava um pouco como é que foi a minha chegada na literatura, quer dizer, foi uma coisa absolutamente episódica e por acaso. Eu sempre brincava no final que o livro tinha salvado a minha vida, que esse livro abriu pra mim um horizonte que estava completamente fora da minha perspectiva naquele momento. Aí tem um amigo meu, que é o editor e diretor do Jornal Rascunho de Curitiba, ele sempre brincava comigo falando assim: “Isso aconteceu comigo também e tal”. E aí o pessoal falava: “Vocês parecem dois pastores, por que vocês não abrem uma igreja?”. Bom, enfim, aí o tempo passou e eu continuei fazendo essa brincadeira, continuei então dizendo sozinho que era um pastor, que tinha uma igreja e tudo, e aí uma outra vez eu estava em Curitiba e falando essas mesmas coisas, e no final uma menina chegou perto de mim, a Emanuela Siqueira, e falou assim: “Vamos abrir a igreja”. Eu falei: “Como assim?”. Ela falou: “Não, estou te falando sério. Eu apoio, eu faço uma página, eu faço Facebook e tal, eu só preciso da sua autorização”. “Imagina, você tem toda autorização”. Mas eu não levei muito a sério aquilo. Não é que ela abriu, e ela mantém, é uma coisa bacana, muito bacana. É uma coisa semi-profissional que ela faz, então eu a nomeei bispa mundial (risos) e nossa igreja tem a sede mundial em Curitiba. Eu sou só o presidente honorário da igreja.

Ricardo Biazotto (Over Shock)No depoimento que você dá falando sobre isso, você cita que dizem que o brasileiro não lê, mas eles não foram apresentados aos livros. Recentemente o colunista da Época, Danilo Venticinque, escreveu um texto chamado “O Brasileiro não lê”, ironizando essa frase que é muito usada, mas ele cita no final que não adianta repetir sempre a mesma coisa e não fazer nada para mudar essa realidade. O que o Ruffato faria para mudar essa realidade que infelizmente acontece no Brasil?
Ruffato – Olha, eu creio que assim, não existe institucionalmente um trabalho no sentido de promover o livro e a leitura no Brasil. Existe pontualmente, mas não uma coisa séria. E aí não é este governo. Nenhum governo até hoje fez qualquer trabalho no sentido de dar, de promover o livro e a leitura. O que a partir do governo Lula tem sido feito, aí de uma maneira até bastante importante, é através das compras governamentais, do Plano Nacional de Bibliotecas Escolares, é comprar livros e colocar na escola. Isso já é um avanço incrível. Por quê? Porque uma coisa é você não ter nenhum livro na biblioteca, e você não vai ter nenhum leitor, evidentemente. Outra coisa é você ter livros. Significa que vai ter leitor? Não sei. Mas pelo menos você pode ter leitor, na outra opção não tinha nenhuma possibilidade de ter leitor. Então assim, isso é um fato. Agora, isso sozinho não ajuda. Eu acho que cada um de nós tem um papel importante nesse processo. Eu tenho feito, o que me é possível. Escrevo sobre isso, falo sobre isso, todos os lugares que eu vou conto a minha história, que é uma história emblemática no sentido de como o livro transformou a vida de alguém, então assim: eu acho que eu tenho feito o que o possível. É muito? Não, é pouco. Muito pouco, mas é o que eu posso fazer.

Ricardo Biazotto (Over Shock)Mudando um pouco de assunto... Recentemente você ganhou o Prêmio Casa de las Américas. Eu gostaria que você comentasse sobre o seu sentimento ao ser premiador com uma premiação tão importante.
Ruffato – Eu já ganhei vários prêmios. Ganhei o Machado de Assis, APCA, Jabuti, Casa de las Américas, e eu digo a mesma coisa pra você: assim, prêmio na vida de um escritor, talvez na vida de um artista, ele é uma coisa por acaso. O fato de ter ganhado o Prêmio Casa de las Américas, por exemplo, neste ano, significa apenas que as três pessoas do júri gostaram do meu livro. Se fosse três outras pessoas talvez gostassem de outro livro. Então assim, não estou menosprezando evidentemente, muito pelo contrário, eu sinto uma felicidade incrível, mas eu sei exatamente o peso que se tem. É muito relativo. Então assim, o fato de eu ter ganhado o prêmio este ano não significa que é melhor livro publicado no ano passado, o que seria bobagem e até estupidez da minha parte. Significa apenas isso: que aquelas três pessoas que estavam lá gostaram do livro, me deram o prêmio, eu fiquei felicíssimo, é importante para mim como escritor. O livro sai agora em setembro lá em Cuba, também é importante por causa disso, mas, enfim, eu recebo essas premiações com felicidade, evidentemente, mas também com a humildade de saber que isso não significa muito além do que isso, mais nada.

Ricardo Biazotto (Over Shock) E como o senhor vê o atual cenário literário do país?
Ruffato – Eu acho interessante. O que eu quero dizer com isso? Eu acho o seguinte: tem uma diversidade muito grande. O mercado permite que hoje você tenha um leque de escritores escrevendo coisas completamente diferentes uns dos outros, podendo falar sobre o que quiserem e da maneira que quiserem. Então isso é um dado, digamos assim, fundamental para você ter uma literatura de expressão. Agora se disso, desse momento que nós estamos vivendo, que eu acho o momento mais interessante da literatura brasileira de todos os tempos, se disso vai sair alguma de qualidade ou não? Não sei! Inclusive duvido que alguém saiba, porque quando você está fazendo história, você está fazendo história, então seria ridículo, por exemplo, alguém durante a Revolução Francesa: “Ah, nós estamos fazendo a Revolução Francesa”. Não, você não sabe o que está fazendo. Você está fazendo. Então, vai ficar disso alguma coisa? Sim, certamente vai. É muita coisa? Não sei. Esse momento é mais importante do que os outros momentos? Também não sei. Eu acho que, do ponto de vista da diversidade, sem dúvida é o momento mais interessante. É o que, da literatura brasileira, é o momento que você tem um leque maior de vozes falando, então isso já é um ponto, pra mim, importantíssimo, fundamental.

Ricardo Biazotto (Over Shock)É possível viver de literatura no Brasil?
Ruffato – Não sei, eu vivo, há dez anos. Há dez anos, em 2003, eu larguei o meu emprego, eu era secretário de redação do Jornal da Tarde em São Paulo, quando eu larguei do meu emprego eu falei que iria me dedicar a literatura os meus amigos falaram “você ficou louco!”. Mas não sei, eu vivo, não sou um nababo, mas também não vivo miseravelmente, mas eu trabalho muito. Eu trabalho muito! Então assim, não sei se é possível viver de literatura no Brasil, eu digo pra você assim: eu vivo. Se eu vivo, eu acho que um monte de gente pode viver. Não acho que seja um fenômeno, eu acho que é uma coisa natural. Eu acho que tem um monte de gente hoje vivendo de literatura. Quando eu comecei em 2003 não, em 2003 eram poucas pessoas que faziam isso, talvez naquele momento eu era possivelmente eu era o único a viver de literatura, que vivia exclusivamente de literatura, ou seja, não era colunista de jornal, não era jornalista, não fazia roteiros de televisão e nem cinema, ou seja, exclusivamente aquilo eu acho que era o único. Hoje tem bem mais pessoas.

Ricardo Biazotto (Over Shock)Recentemente você veio a Pinhal participar do Pin Pin de Literatura e agora voltar para participar da Semana Edgard Cavalheiro. Qual o seu sentimento em relação a isso?
Ruffato – Olha, assim, as relações que você estabelece em sua vida, as que sobrevive são sempre as afetivas. E por que eu vim a primeira vez aqui? Porque o Moacir Amâncio, que é um grande amigo meu, trabalhamos juntos no jornal O Estado de São Paulo, que é um grande intelectual, um grande poeta, ele foi fundamental para que eu viesse naquela primeira semana. Na época ele me convidou, eu evidentemente que vim por causa dele, e chegando aqui eu encontrei outras pessoas que moram aqui, que fazem um esforço imenso para dar um verniz cultural à cidade, então também se cria laços afetivos, enfim. No ano passado, se não me engano, eu tinha quase vindo de novo aqui, só que não calhou, eu tinha uma viagem provavelmente, não lembro exatamente pra onde, mas eu tinha uma viagem. E aconteceu que este ano me convidaram de novo, eu falei “Evidente que eu vou”, porque eu acho, primeiro por essa razão afetiva, e segundo porque eu acho que o nosso papel intelectual também é esse: é de que se você pode dar alguma contribuição pra uma discussão mais ampla, uma reflexão, você tem que fazer isso. É uma obrigação.

Entrevista publicada em parceria com o blog Over Shock.

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