quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Educadora Emília Cipriano concede entrevista ao blog Over Shock

Confira abaixo a entrevista realizada pelo blog Over Shock, em parceria com o blog da Casa do Escritor Pinhalense “Edgard Cavalheiro”, com a educadora Emília Cipriano, durante a I Semana Edgard Cavalheiro:

Foto: Ricardo Biazotto/Over Shock
Ricardo Biazotto (Over Shock)Emília, em sua opinião, qual a importância da Educação participar de uma semana cultural como a Edgard Cavalheiro?
Emília Cipriano – Eu acho que primeiro é porque você abrir a possibilidade de os educadores estarem olhando a educação em sua perspectiva mais ampla, que é na relação com a cultura. Aí eu quis trazer a cultura infantil. A importância dessa cultura infantil, as representações que ela tem, as múltiplas formas de se organizar, o jeito como ela está, o sentido, e nessa perspectiva, eu acho que aqui aconteceu uma coisa muito bonita: que é quando você reúne a comunidade junto com os professores, com os grupos, para pensar em uma dimensão de construção coletiva.
Acho que esse é o grande desafio desse momento histórico nosso. Não são soluções individualizadas, mas situações muito mais no contexto que a gente está habitando, no caso na cidade que vocês vivem.

Ricardo Biazotto (Over Shock)A senhora acha que existe um vácuo cultural, dos alunos e dos professores, que impede essa aproximação com o teatro, com a literatura?
Emília – Não tenho dúvida que a gente utiliza muito pouco as múltiplas linguagens, em especial a arte cénica, a literatura, as relações com a música profundamente, e isso é uma pena, porque a medida que você não tem expressão, e a partir dessa expressão que as linguagem fluem, que elas constituem esse sentido, então é importante que a gente resgaste isso, que estratégias como ela possibilitam essa perspectiva.

Ricardo Biazotto (Over Shock)Durante a palestra foram citadas várias formas de acontecer o acolhimento dos alunos. Qual é a principal forma de reencantar o aluno, reencantar o professor, reecantar a sociedade?
Emília – Primeiro percebendo que cada um é único e que tem competências muito próprias, e não subestimar nenhum ser-humano, mas trazê-lo para poder partilhar com os outros suas competências. Segundo princípio: é perceber nas diferenças a riqueza desse trabalho, e que há uma multiplicidade de formas, de olhar, de percepção que precisa ser resgatados por nós.
Não se você estava desde o início, quando eu apresentei imagens de crianças. Você tem desde a criança, que é aquela que a mídia apresenta e tal, mas você tem a criança que está lá no nosso contexto que às vezes não tem nada a ver com aquele estereótipo que é colocado. É romper com isso. É trabalhar com seres concretos, experiências concretas, olhando e se desafiando para enfrentar os desafios desse contexto, que é extremamente, eu diria, desrespeitoso com alguns princípios, distante das necessidades infantis e das necessidades humanas, de percepção do outro.
Você vê que quando a gente é chamado pra tocar, pra perceber, a gente acolhe. Então é essa a provocação maior. É como eu me percebo, construindo uma relação diferente com o conjunto de crianças que atuo.

Ricardo Biazotto (Over Shock)O que a senhora mudaria, o que a senhora acha que seria necessário fazer para mudar a realidade da educação brasileira?
Emília – Primeiro eu mudaria a compreensão de currículo que nós temos. Um currículo muito engessado, disciplinas dissociadas uma das outras, eu trabalharia muito mais no foco da arte, acho que a arte é uma grande perspectiva, porque ela vai possibilitar linguagens diferentes e possibilidades de várias leituras de mundo, não uma única leitura, isso já amplia horizontes. Uma segunda coisa: a formação dos educadores. Precisa ser muito voltada para essa perspectiva, precisa-se retomar isso. A escola ainda é uma escola muito conteudista, muito preocupada com questões já de imediatismo e não de processo de reflexão, eu quero formar alguém mais reflexivo, mais crítico, mais analítico, mais participativo, mais ciente do espaço que ele ocupa. E uma terceira perspectiva seria políticas públicas que contemplasse de fato essa possibilidade de articular a cultura, educação, relações humanas, em um contexto muito mais amplo e não focados de uma forma tão fragmentada como vem sendo, como vem ocorrendo em nosso país.

Ricardo Biazotto (Over Shock)Para encerrar, gostaria que você falasse um pouco sobre sua carreira como palestrante e educadora.
Emília – Na verdade sou professora da PUC de São Paulo há 27 anos, trabalho como pesquisadora da infância, atualmente trabalhos em vários projetos no Brasil, e tenho trabalhado muito essa questão das múltiplas linguagens, da importância de trazer principalmente a arte para o trabalho com formação de educadores e para as escolas brasileiras. Hoje eu sinto que nós avançamos em algumas coisas, iniciativas como essa já são questões que vão sinalizando que é possível. A literatura é uma das áreas que mais vão trazer a gente para o mundo das metáforas, das relações, dos símbolos. Acho que é isso, outra lógica. Claro que na minha carreira, uma coisa eu sinto, formando formadores, porque eu formo professores, que serão formadores de crianças, mas eu sinto que o maior desafio que eu enfrento hoje é trazer as pessoas a se inspirarem mais naquilo que elas fazem, não fazerem disso apenas uma atividade sem afeto, sem envolvimento, sem compromisso ético, sem compromisso estético, sem compromisso político com a mudança dessa realidade.

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